quarta-feira, 20 de julho de 2011

Uma pergunta que anda dando voltas na minha cabeça

Alguém saberia me dizer o que significa "sentir-se culpado por desejar"? E por que alguém haveria de sentir-se culpado por desejar? E como isso surge? E de onde? E quais as consequências dessa culpa?

Preciso escrever sobre isso, mas primeiro tenho que entender o que significa... aiai, vivam essas esfinges que sabem como ocupar a cabeça da gente!
Se ninguém responder vou achar que é outro grande mistério da humanidade.

Um conto para uma tarde de inverno

Faz uns anos eu estava fazendo um seminário de criação literária. Tínhamos uma tarefa: escrever um conto sobre um cara que ia ao cassino, ficava rico e depois se matava! Uma tarefa difícil imaginar o que levaria uma pessoa a se suicidar diante da situação de euforia de ter ficado milionário. 
Então escrevi este conto.


Atrás da luz

Dar-me um tiro na cabeça seria o mesmo que não nascer.

            A incansável expectativa do início da vida me havia cansado. Portanto, nada mais restaria a um homem de coragem além de tomar uma atitude para a resolução daquilo que o angustia.
Andava eu sempre a cismar com a mesma frase “Eu também tenho o direito de estar aqui!”. Ao chegar à escola, porém, sentia-me extremamente indesejado ao ver no semblante dos estudantes a insatisfação pela minha insistência em pôr-me à frente e desatar a falar com o objetivo de compartilhar um saber tão inútil (e eles sabiam que esta também era minha concepção) que sequer podia fazer diferença àquele que, com voracidade e melancolia, abaixo de cafés e outros estimulantes, o havia adquirido com a vã ilusão de que algo podia, um dia, chegar a provocar-me o sentimento da borboleta ao sair do casulo que pode finalmente alçar primeiro voo em direção ao infinito, e percebê-lo infinito, e perceber-se infinita, e respirar e dar o primeiro grito e, só então, planejar e atuar.
Mas não.
A pistola de meu pai me mirava há muito desde as profundezas do armário. Pistola da qual eu deveria ter orgulho, bem como deveria ter tido orgulho de meu velho pai, que se foi sem que pudesse constatar este sentimento em mim, embora me investigasse diariamente, desde a escolha das minhas palavras, até o jeito como eu passava a mão nos cabelos. Então, pela primeira vez, esta pistola-auxílio poderia esperar de mim orgulho, investigando o movimento de acanhamento do meu dedo indicador.
A luz brilha. Independente do que está ao seu redor a luz brilha. E não importa, se colocares o tecido mais negro ao seu redor, no fundo a luz brilha. Queria eu fulgurar como a luz. Quem não tem luz pode viver na escuridão ou humilhar-se e colocar-se sorrateiramente próximo a ela, sugando-a e rogando para que ela não perceba sua presença. Foi assim que adentrei o Cassino Postrero.
Comprovemos então que dinheiro não vale nada. Incomodava-me a idéia de ainda possuir uma nota de cinco no bolso. Não era uma viagem, nem um terno, nem um vinho, nem uma refeição. Todavia, ainda eram cinco. A arma no bolso esquerdo de meu casaco surrado fazia-o ficar mais baixo de um lado que de outro, causando-me um desconforto no pescoço e dando-me uma sensação de assimetria, portanto, resolvi livrar-me logo da nota.
-         Preto 23, tudo.
Talvez tenha sido o girar da roleta, senti uma breve náusea e voltei os meus olhos para dentro. Na meia volta eu ouvi: - Preto 23 e vi o crupier, de cabeça baixa, empurrando fichas para diante de mim. Antes havia algo a perder, agora havia trinta e seis vezes algo a perder. Assim, sucessivamente, fui escolhendo números ao acaso e apostando. Ganhei todas as vezes. Percebi a ironia e, enquanto ganhava mais uma vez, avistei uma primorosa mesa ao fundo. Sentados nela, três cavalheiros muito bem vestidos e belas damas como suas espectadoras. Supus que necessitavam de um último integrante para o jogo de pocker, levantei-me e fui até lá. Quando me acerquei, tive a impressão de que os cavalheiros já me haviam visto na outra mesa, ou que já havíamos nos conhecido em alguma situação da qual eu não estava lembrado. Sentei-me e pude perceber o quanto estava cansado, pois a cadeira afagou-me e remediou a dor que sentia nos joelhos. Sorri. Ao pegar minhas cartas, passei a mão sobre a toalha macia de veludo. Ao erguer os olhos, percebi que, inclusive eu, tinha uma torcedora. Estava à frente, sentada em um sofá com as outras damas. Era jovem, alva, de cabelos longos e louros, seus olhos brilhavam tanto quanto o colar de esmeraldas que levava ao pescoço. Os cavalheiros, ao perceberem o olhar entusiasmado da jovem sobre mim, olharam-me e sorriram. Ganhei novamente. Os cavalheiros se surpreenderam e parabenizaram-me cordialmente. A jovem sorriu e seu sorriso era a luz. Sorri também e ela corou.
Pensei que talvez, por educação, os cavalheiros tivessem deixado que eu ganhasse. Sendo assim, examinei de um modo discreto a parte detrás das cartas a fim de saber se não estavam marcadas. Não havia qualquer marca no desenho requintado. A parte detrás das cartas continha a figura de um rei, pintado em tons de vermelho e detalhes em dourado. O garçom, simpaticamente, nos serviu uma bebida. Ganhei. Para esta próxima partida, eu e os cavalheiros resolvemos arriscar-nos. Diante da expectativa das damas, que agora encontravam-se ao redor da mesa muito eufóricas, resolvemos fazer uma aposta que chamamos de ‘tudo ou nada’. Foi um jogo extremamente tenso, no qual, todos nós, respeitosamente, estávamos torcendo, cada um para si. Mais uma vez ganhei. Nas feições da jovem, ao mesmo tempo que alegria, apreensão. Já eu, surpreso, abri um largo sorriso. Associei o desviar dos seus olhos ao meu sorriso, será que não havia gostado dos meus dentes? Neste momento, me dei conta de como estava vestido, comparando-me aos demais cavalheiros presentes ali. Baixei o olhar e vi minhas unhas, sujas, tortas. Pensei em como estariam os meus cabelos, tentei imaginar mas não pude, pois há muito que não me olhava no espelho para analisar-me detenidamente.
Vi uma cadeira ser puxada para o meu lado, era ela. Quando sentou-se senti seu perfume delicado, pensei em como devia eu de estar cheirando. Tive vergonha de mim por estar tão contrastante com as pessoas dali. Inclusive o garçom, que agora vinha me parabenizar e me servir mais uma bebida, estava melhor trajado do que eu. Foi quando a jovem colocou sua mão sobre a minha e sorriu. Seus dentes, um pouco amarelados, mostraram-se e então dei-me conta de que usava batom vermelho, cor que destoava do ar angelical que demostrava. Ela pegou minha mão e disse que eu não precisava ficar encabulado, pois ali eu era como um deles. Os cavalheiros entreolharam-se sorrindo, talvez rindo, do que havia dito a moça que agora contemplava fixamente as grandes pilhas de fichas ganhadas por mim.
Pedi outra bebida ao garçom que respondeu: - Claro, o senhor é quem manda!, seguido de risos atrás dos leques das outras damas. Eu estava milionário. Um aperto e uma lembrança de que, no passado, a cada humilhação, pensava eu que se tivesse muito dinheiro haveriam de me respeitar.
Ouviram-se gritos e vi o rosto das damas, tão angelicais outrora, agora desfigurados de horror. Os cavalheiros levantaram-se rapidamente e, sem a intenção de fazê-lo, derrubaram a mesa cheia de fichas, cartas e dinheiro. Devido à agitação e ao barulho, os outros jogadores do cassino notaram a movimentação. Houve correria e alguns homens fortes tentaram correr em minha direção.
“Os nossos olhos estão sempre embebidos de uma realidade falsa. Não posso afirmar que este não seja apenas mais um desses momentos. Contudo, conheço apenas uma realidade binária, o vencedor e o perdedor, a riqueza e a pobreza, a ilusão e a realidade, a vida e a morte. Eis aqui, pois, o momento da última descoberta.”

sábado, 9 de julho de 2011

O porquê?

Resolvi colocar esse nome no blog porque adoro a música Águas de Marco. Acho que a letra quer falar sobre começos e finais, que todo começo é um final e todo final é um começo.... coisas do ciclo da vida. 
Eu gosto especialmente da parte que diz: 


É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã



Este verso fala do projeto da casa, ou seja, das ideias, dos sonhos. Depois vem o corpo na cama, o fim do sonho, porque ele simplesmente fica de lado. Depois o carro enguiçado, o imprevisto. A lama: o fundo do poço. Depois um passo, logo uma ponte: o novo início. Um sapo ou uma rã? A dúvida. Um resto de mato, resquícios do que foi. A luz da manhã, a esperança. 


Tenho um milhão de interpretações sobre essa música: a esperança, o fracasso, o inevitável, a vitória, a luta de sempre, etc, etc, etc.
Acho que é um bom nome para um blog, muito abrangente. Acho que é um bom nome pra qualquer coisa, até teria uma gata que poderia se chamar Éachuvachovendo... e então quando eu estivesse dormindo e ouvisse algum barulho em outro cômodo da casa, poderia pensar "ah, não é nada, é só a chuva chovendo, ou Éachuvachovendo. Acho que o ser humano ficaria mais relaxado e deixaria a vida acontecer de maneira mais tranquila se tivesse alguma coisa (que faca algum ruído, claro) que se chamasse assim. 
Olha só, recém comecei a escrever e já tenho uma primeira ideia para mudar o mundo!
... é a luz da manhã, é o tijolo chegando...